A Palavra e o Palavrão em Crônica
na Mesa do Bar - Cedo ao dizer, ele tem sede desde cedo. - Ratifico, nesta sede, é por certo escritor. - Não, não, retifico, ele é só reles teclador. - E existe essa palavra? Diz-me, por favor. - Neologismo besta, que o autor inventou. - Cerveja, mesmo devagar, o faz levantar. - É claro! Tem que o xixi desanuviar. - Começo a captar esse começo. - Continuemos a conversa sem tropeço. - Pena, não mais se usa tinteiro. - Estás ligada? Tinteiro não é quem pinta. - Não precisa me expiar quem pinta é pintor. - Pois é, mas espia, pintor deveria ser pinteiro. - Só porque tinta vem do tinteiro? - Shhhhh! Lá vem o gato de novo. - O gato, outra vez, nem as mãos lavou. - Estou falando do gato de patas, o miador. - E eu do gato de dedos, o teclador. - Tu és como palavras assanhadas. - Que de mim, um palavrão, tu esperavas? - Mais jeito, um bom gesto, menos desrespeito. - Nasci, a despeito, desse jeito, sem trejeito. - Vou me apresentar em primeira mão. - Não! Fica no teu canto, dessa vez eu que vou. - Meu canto é um encanto, mas tu és só palavrão. - Fica na tua, no teu recanto, eminente cheia de pudor. - Iminente, ele te jogará no lixo, pois não te usa não. - Aff´s! Ele está na dividida entre lima e limão. - Lima não dá boa rima. - Depende da lima. - Não, não tem lima que dê boa rima. - Sim, rima, tangerina com limão. Que confusão! - Eu não disse? Tangerina com limão é rima de balcão. - Quer dizer caipirinha? Não mangues que assim tu me zangas. - Depende da manga, para talhar ou gerar zanga. - Pois provas provocar e cortar e vem me mangar. - Tira a canga burra, falo da manga que dá no pomar. - Hummm delícia! Não fale não, dessa eu adoro o cheiro. - Também gosto. Como, como? De noite, sem olheiro. - Então tu gostas da manga do candeeiro. - Como tu és burra palavrão. Como, sem divisão. - Burra és tu, palavra, que não tens opinião. - Besta és tu, que em tudo opinas. - Todo dia nessa mesa de bar, a mesma rotina. - Pois é, o burro e a besta tem lá sua sina. - Quem é mais besta e quem é mais burro? - Simples, o burro é besta e a besta é burro. - Parece que ele está pensando. - Não, oferecida, ele está parando. - Mas, por quê? Se tava só começando. - Porquê a tinta acabou, que pena! - É porque, porquê, por que ou por quê? Sempre tenho dúvida. - Não vaciles, os porquês são as alegorias das parábolas. - Pois aí é que muita gente se embola. - Só quem pisa na bola e com a regra se enrola. - Desculpe-me o português, mas não vou baixar a bola. - É idioma para raros, desde aqui até Angola. - Que pena? Não mintas. É teclado ou é pena que pinta? - Não te ressintas, é cartucho da impressora jato de tinta. - Não me enlouqueça, raivosa, eu não sou cegueta. - Podia pegar a caderneta, continuar, só usando a caneta. - Ele saiu sem apagar a manga da lamparina. - E se a gente morrer dessa Morte Severina? - Se não me usa, nem ligo, pode toda letra ser exterminada. - Se eu morrer, asnada, não haverá mais palavrada. - É mesmo? Pois não duvides em morrer queimada. - Então, a conversa antes de começar, já começará terminada. MARCELO RUSSELL
Enviado por MARCELO RUSSELL em 27/04/2015
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados. Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor. |