MARCELO RUSSELL

A franqueza tem limite na indelicadeza. Passada a fronteira, está a rudeza.

Textos

ACORDA RECIFE, ACORDA!

Fatos escabrosos já não clamam por salvação, tampouco, cogitamos sobre eles. Falta-nos tempo ou retidão e bons intentos para tocar no tema. Pagamos caro por isso. 

A modernidade atropela virtudes, codifica a bestialidade e encara com pavor qualquer ensaio na melhoria da qualidade de vida. Apegados ao disfarce que veste esse caos, encobrimos nossa terrível realidade. Mas, o véu é diáfano. 

No privativo, sob a capota, notamos ao nosso redor que a demora de duas horas de Casa Forte para a Ilha de Joana Bezerra, nada denota para o Recife. Tampouco, a mesma demora para ir de carro de Boa Viagem para o Centro. Desse modo, trajetos de dez minutos passam a ser normais, quando delongados em duas horas. 

Só avista-se o que está dentro da caixa. Dentro dos carros. É necessário baixar os vidros e ver o que há lá fora. Quanto custa aos bolsos da sociedade um médico, um engenheiro, um advogado, um gestor público e tantos outros trabalhadores, presos no trânsito sem produzir? Some-se, ademais, o desgaste e o dano humano - físico e mental – dos que sofrem essa punição temporal todos os dias, moídos pelas transgressões e iniqüidades dos outros, para ir e voltar ao trabalho.

Tem até graça - e é engraçado mesmo - quando um recifense diz “estou no corre-corre da vida”. Como assim? Se o Recife parou.

Nos anos 1970 no reclame do DETRAN, seu Leonino cantava alegre: “Faça o trânsito andar, não deixe o Recife parar”. Se você tem menos de quarenta anos, pergunte aos seus pais sobre essa publicidade. O ensaio pouco adiantou. O Recife empacou. Naquela época, tal fato ainda bradava por salvação. Hoje é só blá-blá-blá.

No filme “De Volta para o Futuro 2” de 1989, criou-se o mundo em 2015 com carros voadores. Por certo criaram a trama sem pensar no Recife. Hoje, tanto faz, indo ou vindo, a cidade está fechada. Aonde iremos parar? Ou melhor, parados já estamos. Chegamos aonde ninguém quer chegar. Melhor seria perguntar: Quando voltaremos a fluir, andar, mover ou transitar? 

Não temos mais, parece, aptidão para regular nosso sistema de tráfego. Estamos deseducados. Optamos, indignados e sem esperança, pela rixa no estreito das ruas. Ruas de brigas. Gladiamos dia a dia com pedestres e motoqueiros. É a nova regra. 

Instruímos a arrogância nas ruas e desaprendemos a cobrar soluções de quem ocupa o poder. Fazer uso adequado dos recursos fiscais seria, talvez, a solução. Tais exigências mínimas, educação e governo, diante de tantas leis, como os Princípios da Legalidade, Impessoalidade e da Razoabilidade, eficientes em qualquer lugar do mundo, deveriam ser aproveitados por aqui, mas disso não usamos.

Então, que tal refletir, com urgência - iniciando em nossas casas - sobre projeto para impor uma ordem calcada, sobretudo, na evolução da vida? Ou desejamos ser para sempre o esterco do declínio humano, por conta do “corre-corre”? Por falar em correr, corremos sério risco de perder a oportunidade de agir, por mera negligência e idiotice 

Até mesmo o galo, símbolo maior do carnaval do Recife, imponente e grandioso como a torre parisiense, fica parado, mas diferente da torre que nada atrapalha, o galo fica acorrentado em cima do Capibaribe, obstando geral o fluxo. Podemos usar, nesse diapasão, o "Frevo do Galo", de Paulo Fernando, para cantar:

Acorda Recife, acorda, que já é hora de voltar a andar...
MARCELO RUSSELL
Enviado por MARCELO RUSSELL em 16/03/2015
Alterado em 20/03/2015
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